Normalização do setor de eventos: o que a produtividade e a competitividade têm a ver com isso?
[Por Revista Eventos, 25/03/2015]
No final do século XIX o paradigma da produção de automóveis estava centrado na seguinte configuração: um grupo de profissionais (artesãos) de alta qualificação fabricava peças e componentes específicos e era, ao mesmo tempo, responsável pela montagem do veículo e pela realização de testes funcionamento, à semelhança da produção de um protótipo, nos termos que conhecemos hoje. Naquele momento, cada veículo era único e poderia diferir no tamanho e na qualidade, já que era produto do trabalho de diferentes artesãos que trabalhavam separadamente. Conceitos como o de confiabilidade, conformidade, metrologia, tolerância e especificação ainda eram bastante incipientes, e passariam por um desenvolvimento importante ao longo do século XX até chegar nas versões modernas que conhecemos e utilizamos hoje.
Mais de cem anos depois e, certamente, baseado em outro contexto e em outras questões e necessidades, o setor de eventos, atualmente, passa por preocupações semelhantes que buscam construir parâmetros que permitam que a qualidade da organização de eventos se eleve para um novo patamar, onde os conceitos fundamentais da qualidade moderna, acima descritos, possam ser plenamente desenvolvidos e viabilizem a transformação da indústria de eventos num setor de excelência.
A partir da necessidade latente da normalização do setor, a Comissão Especial de Estudos de Gestão de eventos número 142 (ABNT/CEE 142), cuja a normalização estava centrada no campo da sustentabilidade na gestão de eventos, teve seu escopo ampliado para incorporar as questões do setor como um todo, e não apenas a questão da sustentabilidade. A primeira reunião a partir da mudança foi realizada no dia 08 de novembro de 2014, em São Paulo. Posteriormente, no dia 05 de março de 2015, aconteceu a segunda reunião da Comissão, agora em Florianópolis, onde foram definidos os temas de estudo para normalização:
1. Terminologias
2. Segurança em Eventos
3. Competência do Profissional de Eventos
4. Boas Práticas em Eventos
5. Qualidade em Eventos
Todos os temas apontados são de extrema relevância para o setor e, uma vez implementados e incorporados à realidade empresarial, podem ser traduzidos em um aumento da produtividade e da competitividade das empresas aderentes e de todo o setor. Vale complementar, contudo, que a adesão das empresas à normalização é voluntária. Nesse sentido, fica a pergunta que empresários e agentes do setor podem e devem estar se fazendo: porque razões uma empresa deveria se preocupar com essas questões e contribuir para construir e, posteriormente, aderir voluntariamente à normalização do seu negócio?
Para responder a essa pergunta, podemos pensar nos efeitos que a garantia da qualidade externa e da qualidade interna proporcionada pela adesão às normas e requisitos podem produzir. Externamente a adesão à normalização é uma sinalização fornecida aos clientes e ao mercado de que a empresa possui condições de fornecer os produtos e serviços solicitados na qualidade, nos requisitos e nos prazos previamente acordados. Além disso, o próprio processo de construção das normas pelo setor pode demonstrar um elevado grau de articulação e maturidade do trade empresarial, das entidades representativas e dos demais atores participantes, o que, sem dúvida, proporciona maior influência do setor nas diversas esferas de representação e decisão, sejam elas públicas ou privadas. Nesse sentido, a normalização estimula a competitividade das empresas atuantes no setor.
Internamente, a garantia da qualidade resultante influencia na revisão e na adequação de processos que serão traduzidos em redução de custos e riscos associados ao negócio. Adicionalmente, oferece à gestão do negócio a certeza de que as operações e os processos internos estão sendo realizados de acordo com o planejado, além de sinalizar que um processo de melhoria contínua está em andamento, garantindo, assim, que a cada ciclo realizado o negócio possa elevar ainda mais o seu nível de excelência. Por outro lado, as próprias mudanças proporcionadas exigem que os profissionais envolvidos nas diversas esferas do setor se reformulem e novos paradigmas sejam exigidos para a formação e qualificação dos profissionais ingressantes. Em outras palavras, há um grande estímulo ao aumento da produtividade das empresas.
Vale destacar que esse processo diz respeito a toda a cadeia produtiva do setor, não sendo restrito apenas aos organizadores de eventos, mas também a todos os fornecedores participantes. Não precisamos ir muito longe para deduzir que a realização de um evento depende de uma série de serviços que, juntos, são responsáveis pelo seu sucesso ou insucesso.
É premente que o setor de eventos, que em 2013 gerou um faturamento de R$ 209,2 bilhões de reais, correspondente a 4,3% do PIB, cuja importância na geração de emprego, renda e tributos é notória, fortaleça sua articulação no sentido de criar normas que organize o mercado e permita um crescimento ainda maior desta atividade econômica, traduzindo, assim, sua força econômica em maior capacidade de organização setorial, maior representatividade política e maior capacidade de adaptação às transformações e tendências econômicas mundiais.
* Agradeço a leitura crítica de Ana Cláudia Bitencourt, Maurício Cavichion e Ariane Angioletti.