Impactos da economia colaborativa são debatidos em reunião da Comissão de Turismo
Fenômeno mais presente nos últimos anos, sobretudo em virtude da incorporação da tecnologia no cotidiano, a economia colaborativa e o uso compartilhado de serviços oriundos de plataformas digitais já causam impacto no panorama e na atividade do turismo. Sobre esse assunto, a Comissão de Turismo, da Câmara dos Deputados, realizou um seminário reunindo pesquisadores e o trade de hospedagem – em modalidades tradicionais e colaborativos.
Liderada por Herculano Passos (PSD-SP), a turma de deputados, abordou a temática está semana. E, Ana Lavaquial, especialista em gestão e inovação – com palavra na ocasião -, a economia colaborativa pode ser compreendida de uma maneira bastante simples. “É, basicamente, juntar o ‘eu preciso’ com o ‘eu tenho’ a partir de plataformas com base tecnológicas, que geram eficiência e confiança a partir de uma nova moeda chamada reputação”.
Duas das plataformas mais conhecidas no Brasil são o Uber, que conecta motoristas e passageiros, e o Airbnb, que liga anfitriões e hóspedes. No entanto, existem centenas de outros exemplos desse novo tipo de negócios, como Getninjas, que permite conectar prestadores de serviços variados a possíveis clientes, ou o Enjoei, que possibilita a venda de roupas e acessórios usados.
No turismo, a hotelaria tem sentido o impacto das plataformas de hospedagem. Para Dilson Fonseca, presidente da ABIH (Associação Brasileira da Indústria de Hotéis) Nacional, a falta de regulamentação da economia colaborativa gera uma concorrência desleal. “O setor não é contra esse novo modelo de negócios, o que nós precisamos é isonomia tributária, lealdade no procedimento do exercício da mesma atividade, o avanço coletivo, a transparência, e que todos sejam regulamentados”.
Manuel Gama, presidente do Fohb (Fórum de Operadores Hoteleiros do Brasil), por sua vez, elencou normas as quais os hotéis são submetidos, mas as plataformas não. “A hotelaria não quer aumentar as dificuldades para o Airbnb. Só quer ter as mesmas regras”, citando algumas obrigações como a adequação às leis do turismo, do inquilinato e de zoneamento; as questões tributárias; obrigações trabalhistas; normas de segurança; adaptações para acessibilidade; licenças e alvarás; seguros de proteção; e qualificação de mão de obra.
Já Alexandre Sampaio, presidente do CNC (Conselho Empresarial de Turismo e Hospitalidade da Confederação Nacional de Comércio, Bens e Serviços), afirmou que os meios de hospedagens tradicionais têm coobrigação legal e formal de controlar esse processo. “Usando as plataformas, os proprietários dos imóveis estão exercendo uma atividade comercial difícil de ser tributada com eficiência. Além disso, os fluxos financeiros gerados por meio de cartão de crédito em plataforma online podem transitar fora do território do imóvel. Podemos, portanto, supor que um proprietário brasileiro receba o aluguel de seu imóvel em conta no exterior sem declarar a renda no Brasil”.
No contraponto, Flávia Matos, gerente de Relações governamentais do Airbnb Brasil, defendeu que o aplicativo tem embasamento legal e que a empresa deseja contribuir para movimentar a economia nacional. “A atividade exercida entre o anfitrião e o hóspede da plataforma é prevista pela Lei do Inquilinato. Além disso, nós estamos comprometidos em fazer o pagamento justo de impostos, inclusive os do turismo, em todas as jurisdições onde atuamos. E estamos comprometidos também promover o compartilhamento responsável de lares e em fortalecer os destinos turísticos”, afirmou.
Flávia seguiu acrescentando que o perfil do usuário do Airbnb não é o mesmo da hotelaria. “Atendemos um segmento de mercado com exigências particulares, é uma experiência completamente diferente de viagem. Analises mostram que os hóspedes que locam pela nossa plataforma correspondem a apenas 0,65% dos turistas domésticos e estrangeiros no Brasil. Então, tem um mundo de 99,35% de turistas a ser explorado pelo mercado”.
Outros países ao redor do mundo já sinalizaram com legislações específicas para as plataformas de hospedagem. Na maior parte deles, o morador ou proprietário do imóvel tem que estar junto com o hóspede. Também é estipulado um período máximo de locação durante o ano, há necessidade de uma licença comercial, bem como o pagamento de uma taxa para registro de locação por temporada. No Brasil, no entanto, ainda não há nenhum tipo de regra.
Diante desse panorama, o deputado Herculano Passos propôs a criação de uma Comissão Especial de Estudos do Marco Regulatório da Economia Colaborativa, na Câmara dos Deputados. “Esse é um modelo de consumo que só vai crescer, não há como evitar e nem queremos isso. E ele abrange várias áreas, não só o turismo. Então queremos discutir, sim, as plataformas de hospedagem, os aplicativos de transporte ou de restaurantes, mas essa comissão será mais ampla”, explicou.
O MTur (Ministério do Turismo) e o Embratur (Instituto Brasileiro de Turismo) também têm participado das discussões concernentes ao tema. Para Vinicius Lummertz, presidente do Instituto, é preciso descobrir e propor fórmulas de consenso. “Não podemos lutar contra algo que, filosoficamente, é natural e faz sentido, mas também não podemos aceitar que a indústria possa entrar em colapso, que o faturamento possa cair, que possa aumentar o desemprego, porque não se produz mais e, sim, se colabora. Precisamos discutir essa nova forma de pensar a sociedade, que logicamente impacta o turismo. É preciso encontrarmos um ponto de equilíbrio e uma solução para novas formas de se viver”.