Coragem para terceirizar
[ Por Vander Morales*, 03/10/2014]
Da leitura de relógios à montagem final de um automóvel, da entrega de documentos em domicílio à contabilidade da empresa, da portaria do prédio à concepção de avançados processos tecnológicos, tudo hoje passa pela terceirização, um modelo vital para a evolução da economia em todo o mundo, preferido em países avançados como Estados Unidos e Japão ou emergentes como Índia e África do Sul.
O avanço da terceirização – utilizada em larga escala em quase os setores produtivos brasileiros – será inevitável, por mais que se coloquem obstáculos à sua regulamentação. É uma questão de tempo, assim como foi para a sociedade se convencer de que o Estado é mau administrador, dando seu apoio à privatização de empresas estatais ineficientes.
Mas não é tarefa fácil. Forças conservadoras e sectárias tentam formar uma barreira ideológica contra esse avanço natural e tornam o processo mais lento que o necessário. Primeiro, usam a desinformação e espalham o boato de que os serviços terceirizados precarizam o trabalho, com o apoio da Justiça do Trabalho. Com isso, conseguem onerar as empresas, que já pagam a mais alta carga tributária do planeta.
O Congresso, temeroso da oposição daquelas forças do passado, se omite diante da obrigação de regulamentar a atividade. Logo, na falta de uma lei, cabe ao Judiciário avocar a missão do Legislativo. A propósito do caso Cenibra – que todo o País acompanha com ansiedade -, o Supremo Tribunal Federal julgará se devemos ou não conviver com esse conceito abstrato que divide atividade-meio e atividade-fim no processo de Terceirização. Enfim, se existe liberdade para contratar e para qual finalidade.
O resultado deste julgamento é uma das grandes esperanças para os que se dedicam à terceirização no País, contratantes e contratadas, numa operação que envolve quase quinze milhões de pessoas.
Na esfera política posições antagônicas ainda deixam um cenário nebuloso para a questão. De um lado, a equipe da candidata governista Dilma Rousseff com uma proposta de regulamentação da terceirização de modo a agradar o sindicalismo.
Vê-se que o ponto central é marcar posição contra a terceirização das atividades fim e permitir a prática apenas para as atividades meio. Neste caso, o governo parece fechar posição contra o Projeto de Lei 4.330, mais avançado até o momento em termos de tramitação, por entender que ele “precariza” as condições de trabalho.
Do outro lado, dois candidatos oposicionistas se manifestam a favor da atividade. A proposta do candidato do PSDB, Aécio Neves, exposta há algum tempo em encontro com dirigentes rurais, é a de avançar no Congresso Nacional com a legislação que regula a terceirização, deixando claro não haver distinção entre atividade fim e meio, pois o produtor é corresponsável. A proposta leva em conta a situação para o campo, o que nos faz entender sua extensão a todos os setores produtivos.
A surpresa veio da terceira proposta, a da candidata do PSB, Marina Silva, expressa no compromisso “Economia para o Desenvolvimento Sustentável”:
“Disciplinar a terceirização de atividades que a viabilizem, assegurando o equilíbrio entre os objetivos de ganhos de eficiência e os de respeito às regras de proteção ao trabalho”. E explica que “a terceirização de atividades leva a maior especialização produtiva, a maior divisão do trabalho e, consequentemente, a maior produtividade das empresas”.
Sabemos que programa de governo é como papel em branco: aceita tudo, das melhores às piores intenções, pintadas da mesma cor. Em política, pode-se percorrer num parágrafo da extrema esquerda à extrema direita com a mesma desenvoltura, como folha de bananeira ao sabor do vento, tudo escrito de modo a atrair os votos de seus oponentes.
Mas o que importa mesmo é que o setor seja finalmente reconhecido no Brasil pela sua importância para a evolução da economia e para a geração de empregos decentes. Seja pelo Supremo ou pelo Congresso.
* Vander Morales é presidente do Sindeprestem (Sindicato das Empresas de Prestação de Serviços Terceirizáveis e de Trabalho Temporário do Estado de São Paulo) e da Fenaserhtt (Federação Nacional dos Sindicatos de Empresas de Recursos Humanos, Trabalho Temporário e Terceirizado).