'Reage, Rio!': Estado terá calendário de eventos o ano inteiro para quadruplicar faturamento
[O Globo, 01/09/2017]
Principal porta de entrada de visitantes no país, o Rio passará a ser tratado com o status que merece. O presidente da Embratur, Vinícius Lummertz, anunciou nesta quinta-feira o lançamento do programa “Mais Rio, Mais Brasil”, que colocará o estado como prioridade na divulgação internacional do turismo brasileiro. As campanhas “vendendo” o Rio como destino a ser visitado vão começar este ano, de olho no público da América Latina, Estados Unidos, Portugal e Espanha. Num primeiro momento, serão investidos R$ 10 milhões na divulgação. As ações vão continuar entre 2018 e 2022 e, ao fim dos cinco anos, o governo federal estima que a arrecadação com o turismo fluminense possa chegar a R$ 45 bilhões por ano, contra os R$ 11,2 bilhões atuais. O lançamento da campanha foi anunciado ontem durante o seminário “Reage, Rio!”, uma iniciativa dos jornais O GLOBO e “Extra”, que, durante dois dias, discutiu, no Museu de Arte do Rio (MAR), formas para o estado sair da crise.
O programa será regulamentado por meio de uma portaria da Embratur que será publicada até segunda-feira. Fazem parte do projeto, campanhas publicitárias, exposições em feiras internacionais e viagens para a imprensa, com a vinda ao Rio de jornalistas de veículos considerados estratégicos.
— Isso não é favor nenhum. O Brasil precisa disso. A porta de entrada (do Brasil) é aqui. Os outros destinos se beneficiam com o Rio forte — afirmou Lummertz.
O Rio também vai ter mais motivos para atrair visitantes. O empresário e presidente do Rock in Rio Roberto Medina falou sobre o calendário Rio de Janeiro a Janeiro, que será lançado no dia 24 de setembro. Entre os eventos pensados para atrair turistas, estão o Rio Montreux Jazz; o maior evento de MMA do mundo; o X-Games, e a abertura do Campeonato Brasileiro.
— Será, pelo menos, um evento âncora por mês e mais outros que, juntos, somarão cerca de 150. Isso ainda pode crescer — disse.
O idealizador do festival de música disse ainda que está otimista em relação à redução da violência para os próximos meses:
— Quando o calendário começou a tomar forma, vimos que tinha a questão de emergência da segurança. Fiz uma carta ao presidente Temer e, a partir disso, começou a se discutir um plano de segurança das Forças Armadas. Tivemos dados importantes, cerca de 70% de redução do roubo de cargas nas estradas. A gente, com paciência, vai melhorar a segurança do dia a dia.
Bruno Marques, presidente do Grupo Cataratas, responsável pelo AquaRio, anunciou, também no seminário, mais uma iniciativa de revitalização: um investimento de R$ 80 milhões na reforma do Jardim Zoológico, que o grupo administra desde o ano passado:
— O zoológico é um projeto que já vinha no edital, de R$ 65 milhões. Depois que o aquário abriu e foi esse sucesso todo, a gente reviu o projeto. Já estamos falando de R$ 80 milhões. O zoológico vai ter um aquário de elefantes, um pinguinário. Sem ser obrigação, mas porque a gente realmente acredita. É isso eu quero passar para vocês: podem investir, porque turismo no Rio dá certo sim.
‘CADA DIA SEM AULA É UMA TRAGÉGIA’
A professora e especialista em gestão pública Claudia Costin, ex-secretária municipal de Educação, chamou a atenção para a importância de garantir o aprendizado dos alunos que estudam em áreas afetadas pela violência, mesmo nos dias em que os colégios ficam fechados por falta de segurança. Para ela, a rede pública deve montar estratégias para que os estudantes tenham um plano de leitura dos livros escolares e façam exercícios nos dias em que não tiverem acesso às salas de aula. Ao participar do painel sobre políticas públicas do “Reage, Rio!”, Claudia citou situações extremas de países em guerra, como a Síria, onde há esforços dos organismos internacionais para garantir o direito de as crianças estudarem. Mencionou ainda uma iniciativa no Iêmen, em que crianças tiveram aulas em casa, transmitidas por rádio.
— Cada dia sem aula deveria ser considerado por todos uma tragédia. As crianças devem ter condições de estudar em casa — defendeu.
Só em nove dos 130 dias letivos de 2017 todas as 1.537 unidades da rede municipal funcionaram. Ao longo deste ano, 414 escolas e creches, onde estudam 148.410 alunos, fecharam. Ontem, 21 unidades do Cantagalo, da Vila Kennedy e do Engenho da Rainha não puderam abrir as portas. A situação é tão dramática que o secretário municipal de Educação, Cesar Benjamim, comemorou o fato de anteontem ter sido o primeiro dia de agosto em que todas as unidades da rede puderam funcionar. Ele crê que haja uma tendência de redução da violência. E disse não ser ufanista, mas “moderadamente otimista”:
— Essa é uma luta com idas e vindas, vitórias e derrotas — disse o secretário, que defendeu, durante o seminário, que sejam feitos esforços para se acabar com o analfabetismo funcional.
A gerente-geral de educação da Fundação Roberto Marinho, Vilma Guimarães, também participou do painel. Ela mencionou o problema das escolas fechadas por falta de segurança e destacou a importância da participação dos moradores para viabilizar o aprendizado dos alunos prejudicados:
— É fundamental o fortalecimento das lideranças locais para atuar nos espaços disponíveis, inclusive na casa das pessoas. A exclusão escolar leva para a vida toda um processo de violência que, às vezes, é armada e, às vezes, é silenciosa.
FUTURO DEPENDE DE TRANSPARÊNCIA E RENOVAÇÃO POLÍTICA
Uma gestão transparente e o estímulo à entrada de novos nomes na política são alguns caminhos apontados nesta quinta-feira para virar a página da crise ética do Rio de Janeiro. Ao participar do painel sobre o tema, o gerente de relações institucionais do Instituto Ethos, Felipe Saboya, propôs que seja posto em prática no estado o Sistema Nacional de Integridade, elaborado pelo instituto, com dez pontos essenciais para uma gestão baseada na ética, na transparência e na eficiência dos instrumentos de controle. Entre os pontos, estão o Judiciário e o Legislativo autônomos e atuantes; novos critérios para contratação de cargos comissionados; fiscalização interna e externa das instituições e processos mais transparentes de contratação de obras e serviços públicos, além da participação direta da sociedade.
— Há três princípios importantes quando se pensa propostas e soluções para o Rio: a corresponsabilidade, não pensar que a culpa é sempre do outro; a criatividade, que é a marca do carioca; e o envolvimento dos jovens com novas ideias.
O jornalista, escritor e ex-deputado Fernando Gabeira defendeu que novos nomes sejam apresentados nas próximas eleições e chamou atenção para o papel do eleitorado no esforço de renovação. Ele criticou as gestões que privilegiaram a economia do petróleo, deixando de lado a vocação para ciência, cultura e turismo.
— Administração íntegra depende também de eleitores conscientes, de instrumentos de fiscalização, de uma imprensa investigativa.
Também integrante da mesa de debates, o deputado federal Miro Teixeira (Rede-RJ) disse que, “enquanto não houver uma administração pública íntegra, não haverá paz no Rio de Janeiro”. O parlamentar rejeitou a tese de que a corrupção se propagou no mundo político para financiar campanhas cada vez mais caras:
— A corrupção existe porque existe corrupto, como o roubo existe porque existe ladrão.
Uma nova plataforma de informações sobre o Rio, desenvolvida pelo Ministério Público estadual, foi apresentada pelo procurador-geral de Justiça, Eduardo Gussem. A base de dados reúne informações sociais, econômicas, culturais, territoriais, políticas e orçamentárias. Gussem sugeriu a criação de um comitê institucional, a partir da realização do “Reage, Rio!”, para análise de cenários e discussão de saídas para a crise.
— A transparência e a integração são fundamentais para enfrentar este momento e olhar para o futuro de forma diferente. O mensalão e a Lava-Jato foram os processos mais importantes do Judiciário brasileiro, mas aconteceram após o dano efetivado. Queremos agir preventivamente, alertando para fatos graves que lesam a sociedade e o erário.
O “Reage, Rio!”, que terminou nesta quinta-feira, teve oferecimento do Sistema Fecomércio-RJ, por meio do Sesc-RJ, patrocínio da Souza Cruz, da Oi, da Alerj e do Sebrae, além de apoio do shopping RioSul.